Energia Nuclear é do bem só falta uma publicidade boa
- Jean De Paola

- 31 de jul. de 2023
- 8 min de leitura

Produzir energia elétrica a partir de um reator nuclear é uma das melhores formas, mais limpa, segura, barata e é horroroso escrever isso, com um menor número de mortes associada. Ao longo desse texto explico cada um desses tópicos, apresento o resultado de pesquisas de vários autores, de vários países. O que existe hoje é uma imagem construída ao redor da energia nuclear que está associada desde o seu início com as bombas nucleares, com os testes nucleares em ilhas no Oceano Pacífico e nos Estados Unidos, passando pelos acidentes em usinas atômicas nos Estados Unidos, na Ucrânia e mais recentemente no Japão. Diversos grupos de pessoas e países têm ideias construídas a partir de impressões desses fatos e não da realidade dos dados.
No final da década de 80 eu estava fazendo a prova para admissão do mestrado no Instituto Pesquisas Nuclear, o IPEN, na USP. Um dos textos para ser analisado era sobre a radiação medida algumas dezenas de metros abaixo do nível do mar Adriático. Essa radiação era devida ao acidente de Chernobyl. Na prova para começar o mestrado parecia haver um aviso, olha lá hein, esse troço pode te fazer mal.
O acidente de Chernobyl foi um dos três catastróficos que aconteceram em usinas nucleares, antes houve o de Three Mile Island (1979), depois esse de Chernobyl (1986) e, mais recentemente Fukushima Daiichi (2011).
Apesar de parecer complexo a geração de energia elétrica dentro de um reator nuclear ocorre por processos bem simples. Da pra dividir em duas partes: como uma locomotiva a vapor daquelas de filme de bang-bang funcionam e como um átomo sofre o processo de decaimento atômico.
Uma locomotiva funciona porque colocam carvão e botam fogo nele, há um sistema de água nas vizinhas dessa fornalha e essa água, com o aumento da temperatura vira vapor, o vapor tem maior volume do que a água no estado líquido e expande, quando ela expande gira algum mecanismo e uma roda gira, a locomotiva começa a se mover.
Dentro do núcleo do reator nuclear há um material físsil, como o urânio-235 ou o plutônio-239. A reação de fissão ocorre quando um nêutron atinge o núcleo de um átomo físsil, esse núcleo então se divide em dois átomos menores, liberando uma quantidade significativa de energia no processo e mais nêutrons. Essa energia está na forma de calor. E é esse calor que será captado e funcionará como o carvão das locomotivas. Esse material nuclear está em um tanque com água chamada técnica e frugalmente de piscina. Essa água aquece e evapora começando um processo semelhante à de uma locomotiva, ao invés de girar uma roda ela faz uma turbina girar. Então, existe um processo de geração de energia, calor, e um processo de captação de energia, por uma turbina que gera energia elétrica.
História
A energia elétrica a partir de usinas nucleares nasceu depois e a partir das bombas atômicas. Albert Einstein já era famoso e havia ido para os Estados Unidos, lá ele tentou convencer o presidente norte-americano de que havia uma necessidade premente de desenvolver a energia atômica pois os nazistas já estavam nessa linha de pesquisa e procuravam urânio na África. Ele insistiu e conseguiu que se iniciasse o projeto Manhattan, que visava o desenvolvimento de energia atômica. Aqui há várias indagações sobre a razão de Einstein NÃO ter sido convidado a trabalhar nesse projeto, ele era europeu? Ele seria um espião? Numa das biografias de Einstein, ele conta que gostaria de ter participado, mas que ficou feliz do projeto ter saído do papel mesmo sem estar na equipe. Então foram construídas e lançadas no Japão (em Hiroshima e em Nagasaki) duas bombas atômicas.
Uns dez anos após o final da segunda guerra mundial foi utilizada energia nuclear para mover um submarino, o Nautilus. Então, só depois, começou a se utilizar energia nuclear para gerar eletricidade para as populações civis.
No Brasil o uso de energia nuclear, assim como em outras partes do mundo, sofre ataques de quando em quando. Na década de noventa um presidente cortou verbas do IPEN e da comissão de uma maneira geral. O mestrado na maior instituição brasileira na área nuclear e com um reator nuclear pra chamar de seu, pequeno é verdade, me fez entender que há diversas áreas de atuação e que criticar a energia atômica era a falta de conhecimento. Além de fármacos uma outra forma de uso é a preservação de alimentos, ao se aplicar uma radiação de baixa intensidade se mata os microrganismos e assim, a deterioração demora mais para acontecer e o alimento dura mais.
Quando você estuda Análise de Ciclo de Vida (ACV) você descobre que para avaliar um processo ou um produto é necessário entender toda a cadeia de produção. Isso vale para produção de um copo, para um projeto de engenharia, para decidir se um procedimento médico é melhor na casa do paciente ou dentro do hospital, e para descobrir quanto se emite de carbono para produzir uma tonelada de aço e quanto se deve pagar a mais para apagar essa pegada de carbono ou, em outras palavras, quanto se gasta de dinheiro para capturar esse carbono emitido para esse processo (minha tese de doutorado).
Claro que vale também para acompanhar a geração de eletricidade pelas mais variadas formas possíveis (energia solar, eólica, nuclear, hidráulica) para saber qual emite mais carbono do que as outras.
Além de obter conhecimento ir para a universidade te permite descobrir de onde vem o conhecimento, qual é a fonte daquilo que realmente importa. No caso de meio ambiente, de geração de carbono, as Nações Unidas criaram a melhor, a mais completa e mais interessante fonte de consulta, o IPCC que traduzido seria alguma coisa como Painel intergovernamental de Mudanças Climáticas. Ao acessar esse site você descobre que milhares de cientistas do mundo todo tem ali o seu trabalho mostrado no que se refere as mudanças climáticas ou, de maneira simples as emissões de carbono.
Se no mestrado eu aprendi sobre energia atômica, no doutorado eu aprendi sobre mudanças climáticas. Analisando os dados de emissões das formas de energia elétrica no gráfico abaixo o que se tem é que a energia nuclear é de longe a melhor para o meio ambiente.

Melhor inclusive do que a gerada por hidrelétricas.
Analisando os dados da Alemanha que possui grande interesse em diminuir emissões e se preocupa com o meio ambiente, e investe pesadamente em energias ditas limpas como eólica e solar.

A Alemanha gasta muito dinheiro para produzir energia de fontes renováveis, porém os dados do ano de 2016 ainda não conseguiram ser explicados. Foram instalados mais 4% de painéis solares, mas se produziu menos 3% de energia solar. No caso de energia eólica foram instalados mais 11% de moinhos de vento, mas se produziu menos 2% desse tipo de energia.
E, para esses dois casos há o problema de como se armazenar essa energia, claro que as baterias são a solução, mas como ter baterias suficientes para uma cidade?
Essas formas de energia não produzem energia continuamente, você sabe disso de maneira instintiva, quando você vai a praia existe um período que o sol é mais forte e intenso e é nesse período que se gera mais energia a partir dos painéis solares. A parte amarela do gráfico é a energia solar, a parte vermelha do gráfico é a energia que deve ser guardada pois todas as outras formas de energia produzem de maneira contínua. Não da para ficar ligando e desligando uma usina atômica, ou um hidrelétrica ou termoelétrica.

Como a Alemanha é um país rico eles pagam mais caro, energia elétrica mais cara, por ter esse cuidado que eles imaginam valer a pena com o meio ambiente. A energia elétrica na Alemanha é quase o dobro do preço na França.
Ou seja, a Alemanha pensa que esse deva ser o preço a pagar por ser um país rico e com preocupações ambientais. Por outro lado, não é isso que acontece, a geração de eletricidade na França é muito mais limpa do que a da Alemanha.


Mais de 90% da energia elétrica gerada na França é “limpa” enquanto que na Alemanha esse número não chega à metade.
Usando ACV para comparar os resíduos de várias formas de energia, conforme o gráfico abaixo, o que se tem é que a energia nuclear gera de resíduo apenas 3 toneladas

Essa comparação, entre as diversas formas de se produzir energia elétrica, vale para o Brasil também, mudando apenas as formas de energia. Quando se estava construindo a usina hidrelétrica de Belo Monte, amigos, conhecidos, professores ou tudo isso junto foram levados a uma companha contra a hidrelétrica e a favor de se instalar painéis solares no lugar. Mostrei a eles que para se produzir a mesma quantidade energia que uma hidrelétrica a quantidade de placas solares deveria ser quase do tamanho do lago. As placas solares refletem (para cima) o calor de maneira mais concentrada matando os pássaros que desafortunadamente passam por cima. Para produzir as placas se gera mais carbono para a atmosfera do uma hidrelétrica (para a mesma geração de energia claro). Mesmo que fosse um deserto, o que não é, colocar placas solares no deserto desaloja os bichos que ali vivem, deserto não é um lugar desprovido de vida. A campanha levada a cabo por ONGs foi tão intensa que e eu como engenheiro tive que explicar isso aos meus amigos botânicos. E, para ficar claro, como eu dizia nas minhas aulas de Mudanças Climáticas não há energia limpa nesse planeta a menos que você seja uma samambaia ou uma avenca.
Bom, se tecnicamente para o meio ambiente a energia nuclear não é ruim, ao contrário ela é melhor, está na hora de falarmos sobre saúde humana e como a energia nuclear nos afeta.
A professora australiana morando agora na Inglaterra Geraldine Thomas escreve há mais de 10 anos que tabagismo e obesidade são mais perigosos do que a radiação. Em um artigo da Science ela apresenta de onde vem a radiação que nos circunda. Metade do total vem do solo, 12 % vem do céu, 15% de procedimentos médicos e 0,3% de todas as bombas nucleares e dos acidentes nas usinas atômicas.

Além das bombas nucleares, outro evento que acaba criando a percepção de que energia nuclear é a pior forma de se gerar eletricidade são os acidentes em usinas nucleares.
O maior acidente nuclear na história aconteceu na Ucrânia na década de 80, em Chernobyl (1986). O núcleo do reator ficou exposto, toda a camada de concreto e aço foi arrancada numa explosão.
O link em azul na figura abaixo reúne trabalhos de cientistas de diversos países e, dessa forma parece pouco provável que todos estejam errados ao mesmo tempo.
Os dados sobre as mortes são de 28 devido a radiação, mais 15 de câncer na tireoide pelo período de um quarto de século. Estimava-se 1% de mortes por câncer e, na realidade, faleceram 160 pessoas. Não foi encontrado nenhuma evidência de aumento de mortes nas repúblicas próximas (Belarus e Rússia). Nenhum problema relacionado com gravidez, seja de baixa fertilidade, mal formação ou mortalidade infantil.

Esses foram os números do maior acidente nuclear da história. O segundo maior acidente aconteceu um pouco mais de dez anos atrás no Japão. Houve um terremoto, seguido por um tsunami, ondas invadiram as instalações da usina e colocaram em curto circuito boa parte do sistema de segurança. Sobre esse acidente, os dados coletados são os mostrados no quadro abaixo.
Nenhuma morte foi relacionada ao acidente, porém aproximadamente 20000 morreram pelas ondas do tsunami. Nenhum aumento de morte por câncer.

Para completar os dados referentes a saúde humana, vou colocar novamente o quadro que estava acima.

Olhando para o lado esquerdo do quadro onde aparece números relativos a mortes, a energia nuclear mata muito menos do que os combustíveis fósseis por exemplo.
A Alemanha decidiu banir a energia nuclear depois do acidente da usina de Fukushima. Mesmo não havendo nenhum dado científico que comprovasse que gerar eletricidade por materiais radioativos fosse pior do que qualquer outro método de geração de energia elétrica. Um país, um dos mais desenvolvidos do planeta, fez uma opção baseado no inconsciente coletivo, assim como a Alemanha, diversas pessoas também acreditam que a energia atômica é mais prejudicial do que qualquer outra, que gera mais mortes do que qualquer outra.
A figura que abre esse texto é dos Simpsons algo entre a chacota e o desafio, entretanto países como Alemanha, Áustria e Suíça proibirem esse desenho depois do acidente de Fukushima revela que sentimento em relação a energia ainda é mais poderoso do que os fatos, mesmo em países de grau educacional elevado.
https://oglobo.globo.com/mundo/alemanha-austria-suica-querem-suspender-episodios-dos-simpsons-que-exibam-acidentes-nucleares-apos-incidente-em-fukushima-2804000.



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